sábado, 29 de novembro de 2008

No Brasil, vasto e complexo país, com uma população de 160 milhões de habitantes e a décima maior economia do mundo, a prática da tortura pode ser encontrada em todas as fases da detenção: prisão, detenção preliminar, outras formas de prisão provisória, bem como em penitenciárias e instituições destinadas aos menores infratores. Além do cenário carcerário, a tortura encontra-se também na sociedade civil: nos morros, bairros, escolas etc. Ela não acontece com todos ou em todos os lugares, acontece, principalmente, com os criminosos comuns, pobres e negros que se envolvem em crimes de menor gravidade ou na distribuição de drogas em pequena escala ou, simplesmente, são de baixa renda.Os propósitos para o crime tortura variam desde a obtenção de informações e confissões até a manutenção de sistemas de extorsão financeira, racismo e extermínio. E, rotineiramente, esses abusos acontecem. O fato de não se investigar, processar e punir seus agentes cria um clima de impunidade que estimula contínuas violações. A persistência dessa situação pontua o quanto à tortura é utilizada nos dias atuais.A adoção da lei que tipificou este crime (lei no 9.455/97) constitui um marco referencial no combate à prática no Brasil. No plano concreto, porém, a aplicação da lei pelos poderes competentes não tem sido satisfatória. Em muitos casos posteriores a edição da lei, as alegações de práticas de tortura não foram analisadas através de processos penais, seja pela ausência de denúncia do Ministério Público, seja pelo redirecionamento da mesma para crimes menos graves como lesões corporais ou abuso de autoridade, por parte dos magistrados. Há, de modo geral, um problema de falta de percepção da tortura como um crime grave contra o Estado Democrático de Direito, talvez porque o fenômeno atinja, quase exclusivamente, as camadas menos favorecidas da sociedade. Esse quadro exige não apenas uma ação decidida de conscientização e de mudança de mentalidade no seio da sociedade brasileira, mas requer a sensibilização dos operadores do direito para essa questão, de modo a criar uma Jurisprudência de aplicação da lei de tortura.Entretanto, associações civis e outros organismos possuem uma ampla gama de iniciativas e instituições positivas destinada a assegurar a execução da lei de modo lícito e a proteger aqueles que se encontraram sob o poder das autoridades. Uma vez mais, o problema é a dependência de um trabalho predominantemente voluntário.Os poderes exorbitantes de delegados de polícia, no que diz respeito à realização de investigações, tornam a maioria delas excessivamente dependentes de sua boa vontade e colaboração. O atual sistema policial torna muito difícil o monitoramento externo da polícia militar, o órgão freqüentemente responsável pelas prisões em flagrante delito. A capacitação e o profissionalismo da polícia são, muitas vezes, inadequados. Alguns, a ponto de não existirem. Uma cultura de brutalidade e, muitas vezes de corrupção, é generalizada. Os poucos suspeitos ricos, se privados de liberdade em absoluto ou até condenados, podem comprar tratamento e condições de detenção toleráveis ou, no mínimo, menos intolerável que a de muitos pobres, geralmente negros ou mulatos.A pesar dos muitos aspectos positivos na legislação brasileira, a prática contra o crime de tortura é pouco eficaz e tortuosa. Com um “paternalismo” que favorece os poderosos nas diversas situações em que o crime é enquadrado. Fatos, dados, relatos diários, frente ao fato do Brasil ser uma sociedade aberta, não são surpresas. Aqueles que se preocupam em conhecer a realidade do país, há muito escutam falar da tortura. O inaceitável, porém, reside no fato de, mesmo com todo o aparato legal, ninguém é, minimamente, indiciado. Enquanto isso, vítimas são feitas diariamente, a luz de uma sociedade que mais parece não ter passado por uma ditadura, não ter tido notícias de extermínios, de práticas abusivas que ao longo dos anos deixaram marcas, além de relatos. Muitos crimes permaneceram impunes, em decorrência de um forte sentimento de corporativismo existente entre as forças policiais, no que se refere à investigação e punição dos envolvidos na prática da tortura. Porém torna-se urgente o controle dessa situação, que, há muito, deixa marcas na sociedade do Brasil e do mundo.

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